quinta-feira, 25 de junho de 2009

É socialmente solidária a autarquia portuense?

Publicado em 24 de Junho de 2009 no Jornal "O Primeiro de Janeiro", Página 2.

Viver e habitar numa cidade socialmente solidária significa viver numa cidade inclusiva, com espaços para todos, onde o reforço da coesão social deve ser sempre um objectivo central e permanente. Por isso, face aos problemas da pobreza e da exclusão social, devemos rejeitar sempre o conformismo, o pessimismo e o fatalismo. Não são problemas irremediáveis com os quais tenhamos que viver resignados. Não vasta dizer que se tem os pés na cidade do Porto quando a cabeça está em Lisboa, é preciso trabalhar para termos uma nova cidade e dar atenção redobrada aos problemas dos cidadãos e da nossa cidade, e reabilitar a cidade com história (num todo), revitalizar a zona alta (que muitas das vezes fica esquecida em favor de outras), resolver os problemas das ilhas particulares que ainda existem em toda a cidade, reabilitar e requalificar os bairros municipais por fora e não esquecendo o interior das habitações, apoiar as pessoas mais fragilizadas e excluídas socialmente.

A situação social da cidade do Porto é muito pior hoje que no passado. Porém, a extensão, intensidade e complexidade das problemáticas sociais justifica plenamente inclui-la entre as primeiras prioridades, quer ao nível da autarquia, como também das próprias juntas de freguesia. A exclusão representa, entre outras coisas, um desperdício de capital humano num momento em que este é um factor essencial de desenvolvimento. Neste sentido, o social não pode ser encarado como um custo, mas sim como um investimento que visa o pleno aproveitamento dos recursos humanos. Numa cidade e numa freguesia submetidas a um processo de intensa mudança, muitas vezes de sentido imprevisível, os segmentos menos dotados de recursos económicos, culturais, sociais e até ambientais correm maior risco de serem excluídos do modo de vida corrente e da participação na vida económica e social. Na verdade, por diferentes factores e circunstâncias, nem todos participam na “dinâmica” de desenvolvimento que hoje atravessa a cidade. Registam-se dinâmicas de sinal contrário, social e territorialmente localizadas. Uma grande parte dos problemas tem expressão e manifestação local, mas tem origem macroeconómica e política numa escala metropolitana, nacional ou mesmo local. A cidade do Porto apresenta os sintomas de crise: envelhecimento demográfico, deslocalização das empresas tradicionais, declínio do emprego, saída de jovens para a periferia pelo simples facto de as casas no Porto serem muito mais caras, problemas de tráfego urbano e de poluição. É preciso estar atento aos impactos sobre a exclusão social, ao reforço e aprofundamento da modernização, ao desenvolvimento e internacionalização da cidade de forma a não comprometer a coesão social. A distribuição no espaço da população, por diferentes categorias sócio-económicas e faixas etárias, evidencia que o Porto é uma cidade social e territorialmente polarizada. A oriente, a norte e a noroeste da cidade, no Bonfim, em Campanhã, Paranhos e Ramalde, concentra-se uma grande parte da habitação municipal, que também tem um peso significativo nas freguesias de Lordelo do Ouro e Aldoar. A Câmara Municipal do Porto tem mais de 14 mil alojamentos repartidos por 53 bairros, onde residem cerca de 50 mil pessoas. Existem ainda mais de 5 mil casas em ilhas privadas, onde vivem cerca de 13 mil pessoas, principalmente nas freguesias do Bonfim, Campanhã, Cedofeita, Paranhos e Ramalde. Simultaneamente, nos mesmos locais, há milhares de casas devolutas e degradadas, cuja recuperação seria um bom factor de revitalização do mercado de arrendamento (principalmente para que os casais mais novos não sejam obrigados a saírem da cidade do Porto onde nasceram). A habitação como direito social básico ainda está por concretizar na cidade do Porto. As bolsas de pobreza e as zonas urbanas em declínio e em crise, onde há uma concentração de problemas, são fáceis de localizar e de delimitar, especialmente com base em indicadores sócio-urbanísticos, e devem passar a constituir zonas críticas de reconversão urbanística, por serem as mais vulneráveis. Humanizar a cidade deveria significar dar prioridade às pessoas e aos seus problemas, em particular aos segmentos populacionais mais desfavorecidos que precisam de mais apoio e oportunidades: pessoas diferentes, idosos, toxicodependentes, pessoas sem abrigo, jovens desempregados, crianças e jovens em alto risco social e humano. As instituições têm que adequar-se para não excluir e para promover activamente a inclusão. É uma responsabilidade de todos que deve levar cada um a questionar-se sobre o que pode fazer e o que pode fazer diferente para que possamos fazer ainda mais e melhor. As políticas municipais na cidade do Porto podem influenciar, corrigir e prevenir os efeitos negativos actualmente existentes por toda a cidade.

Não faz falta para a cidade do Porto o criticar só por criticar se o que é preciso são obras concretas que resolvam os vários problemas das pessoas. Não se pode passar uma legislatura de quatro anos, quanto mais duas (8 anos), sem se projectar e concretizar uma única obra e que
depois, em ano de várias eleições se ande a correr para tapar buracos e dar nas vistas fazendo outro sem número de pequenas obras que na maioria dos casos custam muito dinheiro aos contribuintes e ficam pessimamente implantadas no terreno.
Quem estiver a presidir aos destinos da autarquia portuense tem de estar de corpo, alma e coração para resolver os muitos problemas que actualmente existem por toda a cidade, e não estar com os pés no aeroporto Sá Carneiro e com a cabeça em Lisboa.


Mário de Sousa - Bonfim, Porto
mario.sousa1@sapo.pt / mario.sousa@europe.com

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