quinta-feira, 5 de novembro de 2009

AMBIENTE

TEXTO PUBLICADO EM 05 DE NOVEMBRO DE 2009 NO JORNAL "O PRIMEIRO DE JANEIRO", PÁGINA 2.
Governação: com nova economia verde, rumo à sustentabilidade

A estratégia de governação com sentido político tem de ter em conta o cenário de crises múltiplas com que o mundo se vem defrontando actualmente. Está em curso uma crise económico-financeira internacional sem precedentes, fruto do fracasso do neoliberalismo e do capitalismo desregulado; o risco de nova crise do preço dos combustíveis fósseis paira ainda, na perspectiva da retoma económica vir a fazer disparar de novo a procura de petróleo, com as reservas mundiais no seu pico de exploração; a passada crise do preço dos cereais mostrou como a fome e a pobreza podem emergir inesperadamente, por fragilidade do sistema mundial de produção alimentar; a crise de perda de biodiversidade, danificando os serviços que os ecossistemas naturais prestam à humanidade, decorre paulatinamente em toda a parte, dos oceanos aos continentes; e a crise climática está aí à vista, evidenciando um aquecimento do planeta por efeito de estufa maior e mais rápido que o que se podia antever.
O significado último deste conjunto de sinais globais de crise é simples de divisar: o mundo atravessa uma crise geral de sustentabilidade do desenvolvimento humano. Vivemos uma era em que a globalização é já uma realidade, mas que assenta em pressupostos frágeis e insustentáveis: recurso a combustíveis fósseis, consumo de recursos naturais acima da sua capacidade de regeneração, desperdício e ineficiência no consumo, descontrolo populacional e na utilização de solos, águas e mares, tudo sob escassa regulamentação ambiental, financeira e social. Por isso, a mais nobre tarefa da política nos dias de hoje é a de mudar o modelo reinante de desenvolvimento económico, aproveitando a reacção às crises para reformar profundamente a economia, tornando-a capaz de gerar empregos e riqueza numa base duradoura, e de restabelecer e respeitar os sistemas naturais de suporte de vida que o planeta disponibiliza, e de que a humanidade depende.
O socialismo democrático é de longe a família política melhor colocada para esta tarefa. Sempre fomos pela adequada regulamentação das actividades financeiras e económicas, em vez de deixar rédea solta ao “mercado”; sempre fomos adeptos do multilateralismo e da cooperação internacional necessários para uma governação global, em vez de tendências nacionalistas; sempre favorecemos o primado da solidariedade social, da equidade e da qualidade do ambiente, em vez do crescimento económico como objectivo em si mesmo. É por isso que se impõe que o PS adopte um programa político visionário e ambicioso, que olhe mais além que a simples superação da crise económica. Seria patético se os muitos biliões de euros mobilizados em todo o mundo para reparar os danos da crise financeira, mais não fizessem que restabelecer uma economia pós-recessão nas mesmas bases insustentáveis, com os mesmos riscos, e a mesma tendência para uma sequência de crises e ameaças.
Os investimentos e as apostas políticas de um Governo do PS devem direccionar-se para a criação de uma economia sob um novo paradigma de desenvolvimento sustentável –uma economia verde, transformando o cenário de crises múltiplas em cenário de oportunidades, e libertando Portugal do jugo da dependência de combustíveis fósseis. Os fundos e investimentos mobilizados para fazer face à crise económica têm de dirigir-se prioritariamente à eficiência energética, em particular nos edifícios e serviços, às energias limpas e renováveis, aos transportes sustentáveis, como os veículos eléctricos e a ferrovia, e à criação de novos empregos mais qualificados, menos transferíveis para outros países. De igual modo é imperativo dar prioridade à sustentabilidade das práticas agrícolas, florestais, e pesqueiras, e à gestão eficiente de águas, efluentes e resíduos, como peças fundamentais que são de uma economia e sociedade renovadas. A fiscalidade terá de continuar a evoluir no sentido de se eliminarem incentivos perversos a práticas insustentáveis, seja na agricultura, nas pescas, nos transportes ou na energia, antes desincentivando essas más práticas e incentivando as opções sustentáveis, como é já hoje uma realidade palpável na fiscalidade automóvel. A política de ordenamento do território, de cidades e de uso do solo deve ser reorientada por padrões de sustentabilidade, de combate e adaptação às alterações climáticas, e de manutenção e reforço do capital natural e dos serviços dos ecossistemas. A descarbonização da economia e da energia tem de ser prosseguida em todas as frentes, como verdadeiro motor que é da inovação tecnológica, da competitividade e de novos empregos.
As alterações climáticas são hoje uma das maiores ameaças que a humanidade tem de enfrentar, decorrendo a um ritmo e escala maiores que antes suposto. Portugal é em simultâneo um país com metas ambiciosas de redução de emissões e de recurso a energias renováveis, e é também um dos países europeus que será mais afectado por esta ameaça. Devemos por isso reforçar a ambição e reputação internacional de Portugal como país que decidiu optar por soluções inovadoras para rumar a um desenvolvimento sustentável, saindo da actual recessão com a criação de uma economia verde, de baixas emissões, geradora de empregos e riqueza numa base duradoura, com qualidade ambiental reforçada, e capaz de atrair investimentos em novos sectores de grande potencial.
Por tudo isto, este novo Governo Socialista tem a obrigação redobrada, depois da sua reeleição por maioria democrática, de pôr em prática o seu programa eleitoral (agora chamado de Programa de Governo), com o qual foi sufragado como único vencedor nas recentes eleições legislativas.
O povo está atento, não só para o novo Governo Socialista mas também para as oposições e, principalmente para o contributo que elas (oposições) vão dar ao País num período especialmente e excepcionalmente em grande crise económico-financeira internacional.



Mário de Sousa - BONFIM, PORTO

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